Zona de Impacto - ISSN 1982-9108 ANO 17 Vol. 2 - 2015 - Julho/Dezembro
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Encontros e Provocações: A
Teatralidade na Obra do Artista Plástico Siron
Franco
Resumo:
O artigo aborda questões sobre a teatralidade contemporânea e suas
interfaces
com a obra do artista plástico Siron Franco. O objetivo é examinar os
conceitos
de teatralidade em relação a Artes Plásticas, contribuindo para
construção
cênica. Tal exame sugere como oportuna, a construção de uma ação
performática. Palavras-chave:
Teatralidade; Teatro; Artes Plásticas. Abstract:. The article
addresses issues of contemporary theatricality and its interfaces with
the work
of the artist Siron Franco. The aim is to examine the theatricality of
concepts
for Plastic Arts, contributing to scenic construction. This survey
suggests how
timely, building a performative action. Keywords: Siron Franco – Theatricality – Theater – Arts. 1.
Introdução A
performance, a teatralidade e suas interfaces são um dos pontos mais
investigados no campo teatral na contemporaneidade e em outras áreas da
arte
como as Artes Plásticas, a Dança, o Teatro etc. É pertinente dizer que
a
teatralidade
pode estar no conjunto de
possibilidades cênicas que o teatro nos oferece, como, todo o aparato
cênico e
as modalidades de arte que se insere dentro da representação teatral. Entretanto,
sempre quando o encenador decora um ambiente, isso conduz quem está
assistindo
para uma teatralidade? O que é teatralidade?
E em outras áreas da arte, é possível existir tal
efeito? Talvez, são
reflexões que a comunidade artística sempre irá trabalhar no sentindo
de
descobertas, através de criações e re-significações de espaços, obras e
etc.
Todavia, o presente artigo pretende investigar
a teatralidade contemporânea
tendo como base o mundo pictórico do
artista Plástico Siron Franco. Investigando os efeitos existentes em
suas
instalações, participações em peças teatrais e principalmente nas
provocações
de suas pinturas. Por fim, pretendo
não definir o termo teatralidade como conceito puro, fechado, mas sim,
refletir
sobre o que há de teatral na obra Sironiana e por seguinte, entender
este termo
tão usado e refletido no campo da arte contemporânea.
2.
Sobre a
definição de Teatralidade Com
o objetivo de esclarecer o tema proposto,
usaremos o artigo, Theatricality: On the
Specificity of Theatrical Language da ensaísta Josette Féral,
publicado
pela primeira vez em 1988. Sendo que, neste artigo Ferál recusa-se a
definir a
teatralidade como algo exclusivamente do teatro, ou só de uma outra
área da
arte, pelo contrário, salienta que este conceito é produzido através
dos
olhares que constituem a criação dos espaços e sujeitos. Ou seja, ela
vai além
do campo do teatro. Sendo assim, torna se um importante foco para nossa
reflexão sobre a obra Sironiana, pois podemos perceber que a
teatralidade não é
algo só do teatro. Ao
investigar o conceito de teatralidade, Féral relata três situações que
nos leva
a uma reflexão didática acerca do termo, ela os constitui como:
Theatricality
as a Property of the Quotidian[2],
sendo importante para nosso entendimento. A primeira ela coloca
o espaço como um veículo da teatralidade, os
signos que chegam até o espectador, oferecendo uma reflexão acerca dos
signos
ali distribuídos. Tal reflexão nos traz uma percepção para as
instalações
desenvolvidas fora do teatro, enquanto os espaços físicos. Entretanto,
a
segunda reflexão sobre o tema estudado nos conduz a reflexão sobre a
ocupação
de espaços não convencionais. Ou seja, muitas vezes nos perguntamos se
isso ou
aquilo é teatro. Ou seja, se homem que fica em um terminal de ônibus
está
fazendo teatro, ou se o ator que apresenta em meio à multidão está
representando algo teatral. Em uma reflexão primária diríamos, sim e
não para
as duas situações. Todavia, quando refletimos acerca do exemplo
desenvolvido
pela Josette Féral, percebemos que têm um momento no meio desta
“apresentação”
para o ator, diretor ou alguém que faça parte da equipe técnica
esclarecer os
reais motivos para tal desempenho e assim produzir o olhar teatral do
observador. Seguindo
com o pensamento da ensaísta para examinar
o tema, temos outro exemplo que nos traz mais um olhar sobre os
elementos
teatrais; a teatralidade acontece sobre duas perspectivas, uma a
recolocação do
interprete no espaço e a outra através do olhar do espectador
enquadrando-o em
outro espaço. É um processo de olhar ou ser olhado Féral (2002).
Percebe-se o
quanto a função de quem está diante da obra, ou seja, o espectador se
faz
necessário. Este espaço também pode ser além dos muros de um teatro
enquanto
edifício, a teatralidade não necessita de regras acerca de sua
espacialidade.
Entretanto, nos conduz a uma reflexão, será necessária a presença de um
ator
para ocorrer uma teatralização? Para ter uma teatralidade? Ainda seguindo o pensamento
da ensaista Josette Féral (2002) “The actor is simultaneously the producer of
theatricality and the channel through which it passes”. Percebe-se
que o ator, codifica os
sinais dentro das estruturas simbólicas do palco, da instalação de
qualquer
lugar onde se refere a uma representação artística, ele pode conduzir o
espectador ao significado, oferecendo um caminho reflexivo e ativo
diante do
imaginário da obra. Todavia, está sempre ameaçado por uma falta de
adequação
com signos que compõe a cena, nem sempre o que é premeditado a fazer,
ocorre
como se pensava. O ator pode dialogar com tudo que está ao seu redor:
espaço,
tempo, história, cenário, música, iluminação
e figurinos.
Traz a teatralidade ao
palco. (Féral, 2002). É importante resaltar que o ator, pode fazer isso
tudo,
até por que é um condutor para os signos de uma representação, mas, nem
sempre
isso acontece. Sua ação é estabelecida através de regras derivadas
através de
um conjunto de elementos, que podem corresponder a pensamentos de
outros
proficionais. Se
torna, importante ressaltar diante desta
reflexão, que o ator é elemento importante para um encontro com a
teatralidade,
mas, sua ausência não impossibilita a existência de signos teatrais,
pois o
processo ligado as condições da produção teatral, também são elementos
que
podem teatralizar uma encenação. Por
fim, é de suma importância nesta reflexão,
salientar que o conceito de teatralidade segundo Josette Féral não é
uma soma de
propriedades ou
características enumeráveis, mas podem
ser discernidas por
meio de manifestações
específicas, e deduzidas aos
fenômenos chamados
de "teatral"
(2002. p. 105). No entanto, percebemos que este conceito não é limitado
somente
ao teatro, mas como a ensaísta coloca, ele pode ser encontrado, na
dança, na
ópera, variados desenpenhos artisticos e inclusive no dia a dia. O
termo é uma
ligação entre o espectador, com alguém ou algo que é olhado. “Without this
gaze, indispensable for the emergence of theatricality and for its
recognition as
such, the other would share the spectator's space and remain part of
his daily
reality”. (Féral,
2002, p. 105)[3]
Talvez,
seja o olhar externo que transforma, compõe ou cria uma situação
teatral, seja
ela onde for, como for. É mister dizer que o espectador seja o ponto
principal
para uma teatralidade, se tornando receptor de elementos que constitui
um
imaginário fictício para o real, ou até o real para o fictício, como
percebemos
em algumas instalações do Siron Franco, como “Intolerância”. 3.
Teatralidade
Sironiana Para
uma reflexão teatral aos elementos existentes
na extensa obra do Siron, vamos dividi lá em três partes. Primeiro, os
traços
pictóricos, depois as instalações e por último sua criação estética
para o
espetáculo Martim Cererê. 3.1
Os Traços
Pictóricos Como
foi dito anteriormente, falar sobre
teatralidade nos conduz a refletir sobre o ato da representação a
partir do
olhar externo, de quem está ali para observar. Ou seja, é um elemento
externo
que constitui o fato que ali está oferecido.
A pesquisadora Silvia Fernandes (2010) ao analisar o
mesmo artigo aqui
estudado atribui teatralidade como um termo polissêmico; determinado
pelos
olhares. Assim, percebemos uma pluralidade de sistemas, no qual, o
termo
enfatiza elementos como: a ação, o espaço e o olhar externo. Este
olhar externo, sobre a obra, nos traz uma
reflexão logo no primeiro desenho feito pelo Siron Franco aos onze anos
de
idade, à qual, retrata a
Última Ceia de Jesus Cristo. Ele pinta os apóstolos com uma postura
vertical diante da mesa, sendo
que originalmente estão sentados. Segundo Siron Franco em entrevista
para este
trabalho, ele é conduzido pelo desejo.
Nesta pintura ainda sem nenhum conceito estético formalmente
desenvolvido, ele
traz uma perspectiva real pra o desenho, naquele contorno os apóstolos
estava
há sua altura, ou seja, assim ele podia se comunicar melhor com o
quadro.
Entretanto, poderíamos ficar folhas e folhas pensando o sentindo que o
Siron
trouxe para a imagem, mas, fato que não podemos negar é que crescendo,
aumentando, dilatando o tamanho do desenho, oferece uma maior
comunicação para
o mundo, no qual ele se encontrava, e dentro da pluralidade do conceito
de
teatralidade, podemos constatar um efeito teatral na obra Sironiana,
conforme
relata o pesquisador argentino Oscar Conargo (2008)[4] “Quando
mais esse olhar se torna presente na representação do ator, na
representação
plástica ou literária, mas teatral a consideraremos”. Segundo
Josette Féral[5]
(1988) “É mais comum que a teatralidade
nasça das operações reunidas de criação e recepção”. Sendo
assim, é
importante refletir os caminhos para criação nos quais o Siron
desenvolveu
durante sua carreira, para isso, se faz de suma importância trazermos
aqui uma
reflexão sobre os traços no início da produção e os últimos trabalhos,
não com
o objetivo de comparação de melhor ou pior (com certeza este não é o
caminho),
mas sim, percebemos o quanto os aspectos teatrais foram aparecendo ao
decorrer
de suas produções. Ao
passo que foi se consolidando enquanto artista, sua obra, passou a
receber
vários elementos nos quais foram compondo seus traços. Exemplo disso
seriam os
quadros, nos quais, destacam a relação do ser humano com o animal,
talvez em
uma proporção de metamorfosear-se, animal em humano, humano em animal,
não
sabemos onde começa ou termina. Podendo assim, destacar a ligação com a
performance, quando se usa animais, talvez em busca de uma semelhança
com os
ritos dionisíacos, ou com o objetivo de identificação com o espectador
ou até
mesmo com o objetivo de buscar algum tipo liberdade, como cita RoseLee
Goldberg
(2006, p. 154): “Esses atos ritualizados
eram um meio de liberar essa energia reprimida, bem como um ato de
purificação
e redenção por meio do sofrimento”. Percebemos uma reflexão
sobre quem é
realmente o animal, e que aparece em outras exposições do Siron Franco,
como,
intitulada: “Semelhantes”. Neste
caso, já encontramos certo desenvolvimento nos elementos teatrais; as
cores, os
espaços retratados e os símbolos e signos referidos. Percebemos que
existe um
diálogo entre dois seres, que não sabemos se são humanos ou animais,
algo como
um lençol dividindo esta dúvida e em volta um olhar, como se estivesse
avaliando a cena. Todavia, esta reflexão é particular poderíamos ter
várias
outras, mas, não podemos deixar de apontar mais um passo diante da
comunicação
ao espectador, cores, signos e elementos imaginários, provocam o
observador
para uma reflexão. É
importante ressaltar que o colorido, demarca o surgimento de uma
característica
importante na obra Sironiana, depois de experiências profissionais e
seu
amadurecimento pictórico, o colorido[6]
começa a ser força motriz nos quadros do artista, sendo mais um
elemento para
refletirmos acerca da teatralidade. A
cada reflexão sobra à obra do Siron, percebe-se que se trata de um
artista que
coloca seus sentimentos mais introspectivos dentro de sua produção, a
busca
pelos fatos que o marcaram em determinado momento e sem sombra de
dúvida a
carreira do Siron foi marcada pelos registros e indignações acerca das
catástrofes
urbanas, sendo o acidente radiativo com Césio-137 na cidade de Goiânia
em 1987.
O envolvimento do artista foi de intensa produção, tendo o objetivo de
ajudar
as vítimas com a renda da venda dos quadros e mostrar para o cenário
nacional
que nem tudo estava contaminado na cidade de Goiânia. Para
conseguir alcançar o objetivo proposto, Siron usa novos elementos como
terra e
tinta automotiva na criação dos quadros, com o objetivo de demonstrar à
sociedade o sofrimento enfrentado pelas vítimas contaminadas. Podemos
ponderar sobre três aspectos teatrais. Primeiro, o uso de elementos
como terra,
tinta automotiva e cores de forma com que pudesse contar a realidade e
o
sofrimento que as vítimas estavam vivendo, tornando o fato verossímil
aos
espectadores diante do quadro. Segundo, o imaginário, ou seja, o que
isso
poderia provocar no espectador, e por fim, a ruptura estética, ou seja,
a busca
pelo novo, pelo desconhecido, a criação com o desejo de dizer algo. Os traços que chamamos de teatral, traz à obra, uma linguagem genuina que se
sustenta pela sua
força. Sobretudo, é importante ressaltar que na ação artistica, seja
ela qual
for, está sujeita aos olhares e adjetivos institulados pelo observador,
e isso,
a confere diversas definições. Da mesma
forma, a obra de arte termina por ser muito mais do que aparenta ser,
pois,
como objeto imanente, evoca ainda, e simultaneamente, sentidos que não
estão
propriamente nela mesma, mas nos juízos de valor que o homem costuma
fazer
sobre ela. (CAMARGO, p. 84, 2008) Nesta citação, advém uma reflexão importante sobre
o
objetivo aqui proposto. O olhar teatral sobre uma obra de arte vai além
dos
adereços, objetos, músicas, figurinos e cenários combinados para uma
ação nos
espetáculos teatrais. Significa pensá-las como expressões tangentes
quando
entra o jogo do olhar, do participar
e
do inserir-se na obra, e pricipalmente a capacidade do homem de
representar,
significar, interpretar, ou seja, criar caminhos para que este jogo
entre
obervador e obra aconteça em sua multiplas linguagens. Assim,
refletiremos a
seguir sobre um dos caminhos que o Siron encontrou para estar mais
proximo de
seu desejo de fazer, de comunicar e de mostrar: as instalações.
3.2
Instalações Nos
tempos atuais encontramos diversas definições para o conceito de
teatralidade,
uma das mais frequentes é que este conceito está associado ao que é
agregado ao
texto quando se é encenado. Por outro lado, podemos perceber este
conceito
voltado para construção de imagens a partir de provocações culturais.
Um conjunto
de símbolos vindo de diversas pesquisas, como, os animais da fauna e
flora do
cerrado, as cores e a disposição no espaço, podendo assim, criar uma
instalação. É inegável dizer que, em uma instalação artística, seja ela
qual
for, só pela sua distribuição já nos oferece aspectos teatrais,
sobretudo,
podemos refletir sobre o que salienta a Féral apud
Fernandes (2010 p. 123) “argumenta
que a teatralidade é conseqüência de um processo dinâmico de
teatralização
produzido pelo olhar que postula a criação de outros espaços e outros
sujeitos”. Portanto, ao refletirmos sobre a imagem da
instalação,
percebemos traços característicos de teatralidade, ou seja, ao
preencher o
espaço com figuras que provocassem um olhar atento para a obra, com o
objetivo
de trazer a realidade, com cores e formas e principalmente a forma de
ocupação
do espaço, qualquer instalação pode produzir signos teatrais. Para
investigar o caminho teatral das instalações do Siron Franco, não
podemos de
deixar de citar as instalações intituladas de “Cela
Forte” (1989) “Cela de
Proteção” (1989), “Nações
Indígenas” (1992)
e por último “Ver o peso” (2012). A
primeira traz uma relação entre a exposição de um fato social (Chacina
do 42
DP) e o espaço, Este trabalho relatava uma chacina de dezoito
presidiários, em
5 de fevereiro de 1989. Para tal, foram apinhados cerca de cinquenta
detentos
uma em cela fechada e sem ventilação. A obra, colocada no metrô
Jabaquara,
constituía-se de uma cela de ferro com 2 m de altura, 3,5m de
comprimento e
1,4m de largura, abrigando 18 cabeças humanas de fibra de vidro. Sendo
colocada, em uma estação de metrô, a instalação ocupa um espaço não
convencional para uma representação artística, oferecendo uma
perspectiva
diferente, para o espectador, todavia, a obra interfere no espaço e o
espaço
interfere na obra. Cada objeto cria seu espaço infinito (Genet, 2001,
p. 22). A
segunda instalação, intitulada de Cela de
Proteção, também de 1989, traz um ator, interpretando um
presidiário ao
meio de uma estação de metrô da cidade de São Paulo, como citado
anteriormente,
prevalecendo assim, a união das duas essências artísticas. Este
trabalho
consistia em uma jaula de 1,5 x 1,5m, rodeada por outras quatro jaulas
com
vinte cães de guarda feitos de gesso. O ator Odilon Camargo
representava um empresário,
que tinha como desejo a bolsa de valores e questionava os espectadores
sobre
quem estava preso, ele, ou o povo que o via? Na instalação havia alguns
espelhos que projetava a imagem de quem estava de fora para dentro da
cela. A
terceira instalação traz uma perspectiva artística diante das causas
indígenas.
O Monumento Nações Indígenas
construído em 1992. O monumento constituía-se por 500 colunas de 2,10m
de
altura, feitas com placas de cimento, espalhadas pelas colunas, estão
três mil
cópias de objetos indígenas e 3.500 inscrições rupestres. Além
da função tradicional de homenagem própria dos monumentos, à obra
oferece
outras características que a compõem como uma instalação, por exemplo:
sua
espacialidade que oferece um labirinto para o espectador, e ao mesmo
tempo, em
que ele caminha, encontra artefatos indígenas afixados nas colunas que
forma o
monumento. Portanto,
coloca o observador
na reflexão sobre a situação indígena brasileira. Sendo que, ao olhar
uma foto
aérea da instalação, percebemos o formato da bandeira nacional. Por
último, mas, não menos importante, o trabalho que nos oferece uma
percepção
acerca da teatralidade em sua obra nos tempos atuais, é a instalação
que recebe
o nome de “Ver o peso” (2012).
Trabalho este que iniciou sua circulação pela cidade do Rio de Janeiro
no Instituto Nacional de Traumatologia e
Ortopedia, no qual, têm
um grande
fluxo de pessoas por dia. Este
desejo de fazer, de demonstrar, de compartilhar a sua indignação
interior, é
inserido pelo artista na instalação nos oferecendo reflexões acerca do
conteúdo, e para isso, nesta obra, traz outro elemento que o fê-lo
presente
durante suas criações: o corpo humano. Todavia
antes de encaminhar para as próximas reflexões, faz se, necessário,
destacar os
vários, signos teatrais nas instalações aqui relatadas, como: objetos,
disposição em locais não convencionais e a união entre teatro e artes
plásticas, desenvolvendo aspectos teatrais com múltiplos objetivos.
Sendo a
comunicação plena com o observador que ali estava passando, o ponto
importante
para salientar, porque talvez estes observadores, nunca teriam a
oportunidade
de ir até uma galeria de arte. Por seguinte, o ponto forte acerca da
teatralidade nas instalações do Siron, advém dos espaços criados para
tal, ou
seja, sua ocupação estética e organizacional para se comunicar ao
público,
acaba tornando o espaço tradicional em espaço cênico. Sobretudo, o
preenchimento artístico Sironiano para o espaço, no caso das
instalações,
seria, um caminho, para que este espaço normal, se torne espaço cênico,
ou
seja: Um
espaço cênico pode, potencialmente, ser
todo e qualquer espaço apto a se transformar naquilo a que a encenação
se
propõe, não dependendo, por essa razão, da exigência de qualquer lugar
arquitetonicamente pensado para este fim, a despeito da adequação e
necessidade
de tais lugares para o desenvolvimento de muitas formas de ação
dramática. Daí
decorre o fato de um espaço cênico ser capaz de comportar e representar
outro
espaço (CAMARGO, 2008, p. 58) Ainda
seguindo o pensamento do pesquisador Carlos Avelino Camargo, este
espaço
cênico, não pode ser considerado algo autônomo, ou seja, precisa de uma
contextualização. Todavia
este
espaço cênico não pode ser considerado algo autônomo, porque a
eficiência de
sua contextualização depende de uma articulação entre aquele que dentro
dele se
insere, o ator, e aquele que assiste à ação dramática, o público. Deste
modo, a
transformação de um espaço em um outro possível pode ser pensada como o
resultado de uma permissividade ilusória conduzida pelo ator e
compactuada pelo
público. (CAMARGO, 2008, p. 58) Nesta
questão desenvolvida pelo Camargo (2008), espaço cênico é
contextualizado por
aquele que está dentro, o ator, e aquele que está assistindo a ação
dramática,
o público. Todavia, partindo do pressuposto defendido pela ensaísta
Jossete
Ferál (2002), onde, a teatralidade, não é um fenômeno estritamente
limitado ao
teatro, poderíamos aprofundar o pensamento da citação anterior,
substituindo o
ator, por um objeto no espaço: uma escultura, um quadro, um cenário ou
até um
animal, sendo que até o público, poderia ter sua presença física
contestada,
por exemplo: uma performance transmitida via internet para o mundo
inteiro, mas
acontecendo em um espaço fechado, sem ninguém presente além dos
envolvidos na
ação. “Eu
acho
que arte é provocação, arte é pensamento, no mundo de hoje a arte tem
esse
poder, você pode em um espaço mesclar tudo.
(Siron Franco, 2011) 3.3
Martim Cererê Os
signos teatrais criados pelo Siron Franco em sua participação nas
montagens do
Martim Cererê, foram cheios de intensas possibilidades estéticas.
Diversos
elementos compuseram sua criação, tanto na primeira versão como na
segunda. Estas
possibilidades estéticas do espetáculo trouxeram uma reunião de signos,
elementos
que compunham uma teatralidade, são eles: objetos, figurino, cenário,
iluminação e, por último, mas não menos importante, a corporeidade
construída
para criar o imaginário da obra do Cassiano Ricardo. Para isso, foi
criado pela
equipe chefiada por Siron Franco, elementos como, paus de chuva, tapa
sexos,
painéis e pinturas corporais. Faz se necessário, voltarmos ao primeiro
exemplo
discorrido pela ensaísta Josette Féral (2002), onde, ela define a
teatralidade
diante da disposição dos signos no palco antes de uma apresentação. Ou
seja, a
espacialidade desenvolvida pelo Siron trouxe para o público uma
aproximação à
obra apresentada, criou-se um jogo entre o observador e o observado,
caminho já
experimentado por ele em suas instalações e monumentos públicos. Outro
ponto interessante para examinar foi o “ritual[7]”
desenvolvido entre os atores para pintar uns aos outros durante a
temporada.
Como foi colocado pelos atores Newtom Murce e Adriana Brito, o processo
da
nudez não foi fácil até por que estavam pela primeira vez no palco com
o corpo
completamente expostos para a plateia. Por outro lado, ambos também
salientaram
que o processo desenvolvido nas pinturas, foi de suma importância para
um
confiança sobre o que estavam criando, e o momento da pintura era como
uma
concentração e confiança. A
importância do olhar diante da obra, neste caso, a partir do ato em que
o ator,
se coloca em processo de concentração diante dos traços ali criados
pelo Siron
com o objetivo artístico, ele está fazendo uma re-locação do interprete
no
espaço que ele ocupa, não é mais só um local de ensaio ou preparação.
Se torna,
a atmosfera da obra do Cassiano Ricardo e ao mesmo tempo traz um ponto
muito
forte, a corporeidade construída pelo artista plástico ao pintar os
corpos dos
atores. Na
segunda versão da montagem do Martin Cererê, também nos deparamos com o
quadro
de signos construídos através dos traços do Siron, mas, desta vez, com
um
elenco e uma equipe técnica amadurecida, conduziram um trabalho pautado
em
experimentações entre o artista plástico e os atores. Segundo
a Féral (2002) o corpo do ator semiotiza tudo
ao seu redor: espaço,
tempo, história, diálogo, cenário, música, iluminação
e figurinos. Traz teatralidade ao
palco. Dos elementos que podem
compor uma teatralidade o corpo é sem dúvida um dos mais expressivos. E
nesta
percepção, podemos afirmar que o corpo criado para o espetáculo Martim
Cererê,
foi sem dúvida, um dos pontos mais fortes para sua teatralidade. Após
alguns experimentos, Siron Franco decidiu pintar os atores com tinta
acrilica em azul para as mulheres no sentido vestical e vermelho para
os homens
no sentido horizontal. Segundo o Rousseau (1980, p. 37) a cor azul é
uma cor
fria, a cor do céu ou do ar ao contrário do vermelho que é uma cor
quente,
representa o sangue e o fogo. Ainda seguindo o pensamento do Rosseau, o
vermelho é o símbolo e expressão do “Eu”, que também é símbolo e
expressão da
sexualidade masculina, implica a ideia de prodigalidade, ou seja, de
perda de
substância que pode ir até a morte. A
teatralidade foi sendo construída pelo processo de criação das
personagens.
Cada ator, tendo orientações tanto do Siron Franco, como do diretor do
Espetáculo Marcos Fayad nos ensaios, foram passo a passo, compondo seu
personagem, e a pintura também foi caminhando como forma provocadora de
signos
corporais. Se entendermos a teatralidade como um processo que, acima de
tudo é
ligado às condições de produção teatral. Percebe-se que a teatralidade
sendo
construída nos corpos através dos traços Sironianos, também é
responsável pelo
signo geral do espetáculo, ou seja, o imaginário da obra de Cassiano
Ricardo.
Teatralidade esta, que pode ser conceituada como: a teatralidade
Sironiana. Conclusão
Por
sua vez, a concepção cênica das últimas décadas pode se multiplicar em
várias
vozes e, com isso, dissolver sua autoria entre os vários profissionais
da
equipe. Poderíamos exemplificar essa forma de trabalho com uma
tendência
teatral contemporânea calcada na horizontalidade das relações
criativas, o
processo colaborativo. Neste, a partir da escolha de um tema, o grupo
propõe um
material de estudo, que deve ser acessível a todos os membros.
Pesquisam-se
leituras, imagens, sons, figurinos e adereços, num exercício de
complementaridade. A
teatralidade aparece como um dos caminhos para
nos conduzir ao entendimento da arte contemporânea, como citado no
início deste
ensaio, ou, pelo menos, a uma forte fundamentação reflexiva sobre o
hibridismo
teatral. Para tal efeito, Josette Féral coloca que as tentativas de
conceituar
teatralidade estão ligadas às recentes preocupações com a teoria do
teatro
(2002, p. 94). Contudo, os caminhos são pantanosos e, segundo Féral
(2002, p.
95), “theatricality
is both
poorly defined and etymologically nuclear”[8]. Portanto,
pelo estudo
aqui realizado, percebemos que não existe uma
poética estabelecida, ou um único ponto de partida para o nascimento da
encenação teatral contemporânea. Ela poderá surgir das leituras de mesa
de um
texto dramático, assim como de vários outros estímulos criativos, tais
como
imagens, sons, jogos, improvisações ou ações propostas. Como reflexo
dessas
metamorfoses, a ideia de teatro também se transforma a cada encenação,
a cada
público, a cada leitura de mundo que um encenador pretende fazer. Não
obstante
às suas frequentes reinvenções, o teatro será assegurado pelo
insubstituível
diálogo entre atores e público, seja qual for o seu nome. Além disso,
um dos
caminhos para se refletir o fazer teatral é entender o contexto, os
signos, o
que envolve, o que constitui uma cena. 4.
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Entrevista concedida à
pesquisa de Mestrado de Luiz Davi Vieira desenvolvida no programa de
Mestrado
em História na Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO). GENET,
Jean. O
ateliê de Giacometti. Trad. Célia Euvaldo. São Paulo: Cosac e
Naify, 2001. GONÇALVES,
Luiz Davi Vieira.
A Teatralidade na Obra de Siron Franco:
Uma relação entre História, Teatro e Artes Plásticas (1988 à 1999).
Dissertação (Mestrado em História) Pontifícia Universidade Católica de
Goiás,
Mestrado em história, 2012. GOLDBERG,
RoseLee. A
Arte da Performance: do futurismo ao presente. Trad.
Jefferson Luiz
Camargo. São Paulo: Martins Fontes, 2006. ROUSSEAU,
René-Lucien. A Linguagem das Cores.
Trad.:
J.Constantino K. Riemma. São Paulo: Ed. Pensamento, 1980. Recebido
em março de
2015. Aceito em junho de 2015. NOTAS [1] Professor da Universidade do Estado do Amazonas-UEA, Mestre em História pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás-PUC, graduado em Licenciatura e Bacharelado Artes Cênicas pela Universidade Federal de Goiás. Líder do TABIHUNI: Núcleo de Pesquisa e Experimentações das Teatralidades Contemporâneas e suas Interfaces Pedagógicas – CNPQ/UEA. Performer, encenador e orientador de pesquisas voltadas para práticas e teorias teatrais e suas interfaces com a Antropologia, a Dança, a História e as Artes Plásticas. luizdavipesquisa@hotmail.com [2] Teatralidade
como uma propriedade
do cotidiano. (Tradução nossa) [3]
Sem esse olhar,
indispensável para
o surgimento de teatralidade
e
para o seu reconhecimento
como tal, o
outro seria compartilhar
o espaço do espectador
e continuar a fazer parte de sua realidade
diária. (tradução nossa) [4] Artigo
Teatralidade e Ética,
publicado em português na revista Próximo Ato: Questões da Teatralidade
Contemporânea.
Organização Fátima Saadi e Silvana Garcia [5] Josette Féral
é professora na
Escola de Teatro da Universidade de Quebec desde 1981. Publicou vários
livros
artigos sobre teoria e prática teatral, entre eles: Teatro, Practica y
Teorica:
Más allá de las fronteras (2004). A sua investigação centra-se na
performance e
performatividade: novas formas de teatro, interdisciplinaridade e
multiculturalismo.Também escreveu sobre Teatralidade no ensaio
Theatricality:
On the Specificity of Theatrical Language (1988) [6] Aqui
atribuímos à palavra
colorido, no sentido do uso de várias cores em tons opostos,
possibilitando a
imagem uma aparência com mais colorações. [7] Termo usado
pelos atores da
Companhia Martim Cererê para o processo de pintura corporal. [8] Teatralidade
é tanto pobremente
definida quanto etimologicamente obscura. (Tradução nossa)
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