Zona de Impacto - ISSN 1982-9108 ANO 20 Vol. 2 - 2018 - julho/dezembro
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Os sentidos da maternidade para jovens de Roraima,
o estado brasileiro com o maior índice de gravidez na adolescência do país
Talitha Lúcia Macêdo da Silva
- UFRR[1] Halaine Cristina Pessoa Bento
– UFRR[2] Resumo: Foi realizada
uma pesquisa de orientação fenomenológica-existencial com o objetivo de buscar compreender
os sentidos da maternidade para mães adolescentes que residem em Boa Vista –
RR. Assim, por meio de uma entrevista semidirigida e analisada com base na
Analítica do Sentido da Dulce Critelli, foram entrevistadas adolescentes com idades entre 15 e 18
anos. No que diz respeito às análises, as adolescentes se consideraram mães,
principalmente, após o nascimento de seus filhos, dado que a maternidade para
elas está atrelada aos cuidados diários com a criança e com as descobertas de
novos sentimentos. Para as participantes, ao se cuidar de um bebê é importante
considerar alguns atributos maternos, tais como: responsabilidade,
amadurecimento, atenção e paciência. Logo, os sentidos da
maternidade para estas mães adolescentes vêm sendo (re)significados juntamente
com o cuidado da criança, uma vez que elas buscam a cada dia superar as
barreiras de dificuldades e preconceitos sociais. Palavras-Chave: Adolescente; Gravidez na Adolescência; Maternidades. The meanings of motherhood for young girls from the Brazilian
state with the highest pregnancy rate in adolescence, Roraima Abstract: An existential-phenomenological
orientation research was carried out with the aim to comprehend the meanings of
motherhood for adolescent mothers residing in Boa Vista - RR. Thus, using a
semi-directed interview, adolescents aged 15 to 18 years were interviewed and their
narratives were analyzed based on the Analytical Direction developed by Dulce
Critelli. Regarding the analysis,
the adolescents considered themselves mothers, especially after the birth of
their children, since the motherhood for them is tied to the daily care with
the child and the discoveries of new feelings. To the participants, it is
important to consider some maternal attributes when taking care of a baby, such
as: responsibility, maturity, attention and patience. Therefore, the meanings
of motherhood for these adolescent mothers are being (re)signified along with
the care of the child, since they seek to overcome the barriers of difficulties
and social prejudices. Keywords:
Adolescent; Teenage pregnancy; Maternities. Introdução A adolescência, de modo simples, pode ser
compreendida como uma fase de transição entre a infância e a idade adulta. Das
muitas características eminentes nessa fase, a sexualidade é um aspecto que
configura transformações, assim, no que concerne ao desenvolvimento sexual da
menina este é descrito por grandes mudanças, sobretudo, na gravidez. Disto
isto, faz-se importante pensar na relação entre adolescência e gravidez nessa
fase da vida, uma vez que Roraima configura-se como o estado com o maior índice
de casos de gravidez na adolescência (PONTES, 2014). Nesse sentido, desde os primórdios da evolução
humana, a maternidade recaia sobre a mulher como uma atribuição fundamental de
sua existência, consistindo em verdadeiro papel social de procriar. Com efeito,
atribuía-se à figura feminina o posto de esposa, mãe e dona de casa (BESCHOREN,
2005). Porém, ao longo dos
séculos, a partir das conquistas de lutas femininas exigindo os direitos das
mulheres na sociedade, essa ganhou poder sobre o seu corpo e decisões, como
decidir casar ou manter-se solteira, ter filhos ou não, trabalhar fora do lar e
entre outras mudanças. Assim, a procriação deixa de ser uma imposição social e
passa a ser considerado o desejo (ou não desejo) da mulher exercer a
maternidade. Posto isto, sobre a maternidade
esta é percebida como um estado fisiológico momentâneo da gravidez, evoluindo
para uma ação mais prolongada da mãe nos ensinamentos voltados ao seu bebê. É
uma concepção intrinsicamente ligada a uma ideia de maternagem
(carinho/acolhimento) da figura
materna com o seu filho (ARAÚJO; MANDÚ, 2015). Quando a
maternidade ocorre na adolescência remete, ainda, a dois fenômenos importantes:
o ser mãe e ser adolescente (LEVANDOWSKI;
PICCININI; LOPES, 2008). Logo, além de lidarem com os desafios
próprios de sua etapa de desenvolvimento, também se confrontam com os desafios
impostos pelo contexto da maternidade. Desse modo,
“existem muitas maneiras de ser mãe. A maternidade é modelada pela cultura,
pode ser adaptativa e pode ser reflexível” (FORNA, 1999, p. 32). Dado que a
maternidade é um exercício diário de reflexões, mudanças e aprendizagens na
relação entre mãe e bebê. E que, portanto, ao longo do tempo, a experiência de
ser mãe deixou de ser, necessariamente, algo puramente biológico para tornar-se
um acontecimento singular, porquanto, quando mães em questão são adolescentes,
os aspectos históricos, sociais, religiosos, familiares e econômicos
influenciam significativamente a vivência da maternidade. Logo, a gravidez na
adolescência tornou-se foco de preocupação social em virtude das múltiplas
repercussões associadas a esse evento, como a evasão escolar das mães, as
adversidades no mercado de trabalho, a falta de preparo para lidar com as
questões relacionadas à maternidade, enfim, questões relacionadas a ideias de
“futuro interrompido” e de uma maternidade mal exercida (LEVANDOWSKI; FLORES,
2012). No entanto, a literatura lembra que esta perspectiva é recente (NUNES,
2013, p. 3): É importante lembrar que a
maternidade antes dos 20 anos até décadas atrás não se constituía em assunto
alarmante. Ao contrário, era até bem-vinda quando dentro de um projeto matrimonial.
[...] Na atualidade, esse panorama se modificou e a maternidade antes dos 20
anos passou a ser percebida como “desvio”, e potencial ameaça à ordem social. Posto que com as mudanças
sociais, a mulher vem postergando por mais tempo uma gravidez pelo fato de
buscar, primeiramente, uma independência financeira, por meio dos estudos e de
um bom emprego, antes de planejar ter filhos. Logo, quando adolescentes acabam
engravidando, saindo do tal “modelo” contemporâneo de planejamento de vida, por
vezes, essa situação pode ser vista como um “desvio” social. Assim, levando em consideração
os dados do Ministério da Saúde, estima-se que 19,3% das crianças nascidas
vivas em 2010 no Brasil são filhos e filhas de mulheres de 19 anos ou menos.
Regionalmente, os números tornam-se ainda mais expressivos, pois, a partir de
dados divulgados pelo IBGE em 2014, Roraima é o estado com o maior índice de
gravidez na adolescência do país, alcançando 20,1% do total de gravidezes
(PONTES, 2014, p. 1). Os índices apontam com clareza que, embora a maternidade
precoce não seja esperada, ela é recorrente. Portanto, apesar de parte dos
estudos relacionados à maternidade na adolescência colocarem-na como
problemática, certo cuidado com a rotulação e/ou categorização negativa desse fenômeno
deve ser tomado. Por vezes, a maternidade pode ser, para muitas destas meninas,
um modo de ressignificar suas existências, do qual elas sentem orgulho e é na
relação com seus filhos que muitas delas veem meios de exercer algum tipo de
poder (SILVA, 2012). A conotação complexa com a qual a adolescência,
por si só, é considerada na sociedade em geral, somada às pressões específicas
da experiência do ser adolescente do sexo feminino, tende a ser intensificada
pela ocorrência da maternidade considerada precoce. Nesse sentido, visto que as
duas fases, adolescência e maternidade, demandam uma série de transformações e
ressignificações, fez-se necessário lançar um olhar sobre tal situação. Por fim, considerando que cada jovem pode atribuir
um sentido próprio à experiência da maternidade, aponta-se a importância de
buscar pesquisar os sentidos da maternidade para adolescentes que estão
passando por esta nova experiência em suas vidas. Método Trata-se de uma pesquisa descritiva, qualitativa e
exploratória, de orientação Fenomenológica Existencial. Esta pretendeu
investigar os sentidos da maternidade para adolescentes que são mães.
Participaram adolescentes entre doze e vintes anos incompletos e de qualquer
nível socioeconômico. Para participar da pesquisa, se fez necessária a
assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. No caso da
adolescente ser menor de idade esse foi assinado pelos pais e/ou responsáveis,
além da assinatura do Termo de Assentimento Livre e Esclarecido pela
participante. Não foi definido, a priori, o número de adolescentes
participantes da pesquisa, pois, o critério utilizado foi de saturação, isto é,
“o pesquisador fecha o grupo quando, após as informações coletadas com um certo
número de sujeitos, novas entrevistas passam a apresentar repetições em seu
conteúdo” (TURATO, 2003, p. 363). Após a assinatura do termo de consentimento
livre e esclarecido foram realizadas entrevistas semidirigidas. As respostas
foram gravadas, transcritas e literalizadas para a realização das devidas
análises. Nesse sentido, as respostas das adolescentes foram
compreendidas à luz da Analítica do Sentido proposta por Dulce Critelli (1996),
que, a partir de uma postura Fenomenológica Existencial, propõe uma aproximação
do real através de uma apreensão, diferenciação e expressão daquilo que se
busca compreender. Ao contrário de grande parte dos métodos de pesquisa, a
Analítica do Sentido não impõe procedimentos específicos, regramentos de
conduta do pesquisador ou instrumentos e equipamentos formais, uniformes e
indispensáveis. A Analítica do Sentido preocupa-se,
prioritariamente, com os paradigmas que compõem o olhar do pesquisador, com sua
postura epistemológica, precisando que ele compreenda que faz parte da
realidade que vem à tona na interrogação; e preocupa-se com a manifestação do
fenômeno pesquisado, o modo como ele aparece, realiza-se; é um movimento em uma
direção e cuida de ser, realizando seus sentidos de existir em uma direção.
Desse modo, a Analítica do Sentido busca abrir espaço para que venha à tona o
sentido que ser tem para as pessoas em seu concreto, simbólico e histórico modo
de ser-no-mundo e de relacionar-se com as pessoas e coisas ao redor (CRITELLI,
1996). Resultados Participaram da pesquisa mães adolescentes
residentes em Boa Vista – Roraima com idades entre 15 e 18 anos, de
classe média e baixa, solteiras ou em união estável e a maioria com apenas um
filho. Como expõem a tabela. Tabela 1. Informações sociodemográficas das participantes da
pesquisa
Todos os nomes de flores
das participantes são fictícios para preservar a
identidade das mesmas. Discussão As entrevistas e o contato com as participantes
suscitaram aspectos relevantes acerca de suas vivências com a maternidade. O
primeiro aspecto trata da percepção de si mesmas como mãe; o segundo, os
atributos que as participantes consideraram importantes ao exercer a
maternidade; o terceiro aspecto são os sentimentos que perpassaram na gestação
e que atravessam no exercício da maternidade delas; e o último, a importância
das figuras de apoio e/ou referência, desde a própria mãe da adolescente,
cônjuge, avó, tia, sogros(as) e amigos, na vida destas jovens mães. Vejamos: 1. Percepção de si mesmas como mães: “na gestação não me senti preparada para ser mãe, só quando ele
nasceu é que fui aprendendo” A partir da análise das entrevistas foi possível
perceber que apenas Rosa sentiu-se preparada, durante a gestação, para exercer
o papel materno, diferente das outras participantes que ao longo do período
gestacional não se sentiam preparadas exercer a maternidade. Pois, para elas
apenas com o contato com os seus filhos é que puderam vivenciar as dificuldades
enfrentadas ao cuidar de uma criança. Logo, é uma maternidade construída
através do contato e do exercício dos cuidados com o bebê. Na minha gestação tinha muito medo de não saber
cuidar. Hoje não tenho esse medo porque conforme ele foi crescendo fui
aprendendo. A partir do momento que você passa a cuidar dele é que você vai
aprendendo, vai vendo que tudo é muito natural. A maternidade é um período que aprendemos
a amar, cuidar e mesmo em situações difíceis você vai sentir uma alegria por
estar com o seu filho – Orquídea (18 anos). Foi possível, ainda, perceber que todas as
entrevistadas se consideraram mães, principalmente, após o nascimento dos
filhos. Uma vez que para elas a sensação de ser mãe estava atrelada aos
cuidados diários com a criança. Quando estava grávida amava muito o meu filho, mas
ainda não me considerava mãe porque não o tinha ainda nos meus braços para eu
cuidar – Margarida (17 anos). Antes não me sentia mãe porque quem cuidava mais
dele era a minha mãe e hoje já me sinto porque sou eu quem cuida – Rosa (16
anos). Posso me considerar mãe pelo fato de ter meu
filho, mas de cuidado não muito. Queria ter mais tempo para ele, mas tenho que
trabalhar para o meu filho ter as coisas – Angélica (17 anos). Assim, em situações como na história da jovem
Orquídea, que passou um mês sem cuidar do filho devido a sua cesárea, a mesma
apenas se sentiu “mãe de verdade” quando pode criar (cuidar) sozinha do seu
filho, sem precisar da ajuda dos seus familiares. Portanto, percebe-se que ter o
filho em si, para as participantes, não é necessariamente ser mãe, dado que
elas necessitam cuidar dos seus filhos para se sentirem mães. Ou ainda, quando
Angélica não tem tanto tempo para cuidar do filho por causa do trabalho,
ficando a cargo da sua mãe os cuidados maternos, sente a sua maternidade
fragilizada. Considerei-me mãe a partir do momento que os meus
dois filhos nasceram, porque durante a minha primeira gestação não ligava muito
que iria ser mãe. Era muito nova e não ficava pensando sobre isso. Mas, quando
tive a oportunidade de vê-los nos meus braços foi a melhor coisa que aconteceu
na minha vida. Meus filhos são tudo para mim e só em pensar em perdê-los a
minha vida fica sem sentido – Amarílis (18 anos). Fui mãe de verdade quando peguei ele pela primeira
vez no colo, porque foi o momento que senti e vi que era verdade que eu tinha
um filho – Jasmim (15 anos). Logo, a maternidade, por vezes, está
intrinsicamente ligada ao cuidado da mãe com o seu filho, pois esta não é
somente dar à luz, mas cuidar do filho desde o processo de lactação e,
juntamente com o companheiro, dar banho, trocar, ensinar as fundamentais lições
da língua, os primeiros passos, estudar e etc (BADINTER, 1985). 2. Atributos considerados ao ser mãe: “ser mãe é
ter mais responsabilidade e saber que agora tenho que cuidar de alguém” Com base nos relatos das adolescentes foi possível
constatar que todas as participantes da pesquisa relataram a responsabilidade
como um aspecto fundamental para ser mãe, dado que cuidar de uma criança remete
a uma maturidade a ser conquistada a cada dia, como afirma Orquídea: “Não tinha responsabilidade com ninguém e
hoje tenho que ter com o meu filho”. Assim, a maternidade institui, por vezes, uma necessidade de mudanças e
amadurecimento pessoal devido as responsabilidades sociais, econômicas e
psicológicas que a adolescente precisa ter ao cuidar de um bebê (FERREIRA;
PEDROSA, 2013). Desse modo, a ideia dos autores supracitados, corrobora com as
falas das entrevistadas ao descreverem que com a responsabilidade de educar um
filho acabaram amadurecendo mais, no que diz respeito ao modo de pensar e agir.
Isto é, “pensar que agora você tem que
estudar e trabalhar porque tem alguém para cuidar. Antes você tinha vontade de
sair e viajar, hoje fica um pouco mais difícil porque temos outras
responsabilidades em jogo”, afirma Orquídea. Antes se importava mais comigo e hoje estou mais
preocupada com o meu filho do que comigo mesma. Mudei por causa do meu filho o
meu modo de pensar – Margarida (17 anos). Amadureci bastante na forma de pensar e agir
depois que o meu filho nasceu. Acho que na minha gestação era muito criança
ainda, depois que fui mudando. Quando peguei ele no colo comecei a mudar em
tudo, pensar duas vezes antes de fazer algo – Jasmim (15 anos). Tudo o que eu faço hoje penso primeiro no meu
filho. Ele vem em primeiro lugar na minha vida. Minha mente ficou mais aberta à
vida porque quando somos novas não pensamos nas consequências e hoje tudo que
faço penso no que pode acontecer – Rosa (16 anos). Nesse sentido, a gravidez tem como uma das possíveis características
marcar a entrada na fase adulta e a aquisição da responsabilidade e autonomia
(OLIVEIRA, 2008). As entrevistadas consideraram importante assumir uma nova
postura, ou seja, responsabilidade/amadurecimento perante esse novo fenômeno em
suas vidas. Posto isto, as participantes ainda relatam que com a ajuda dos
familiares não pararam de ir à escola após o nascimento dos filhos, exceto
Dália que por escolha própria deixou de estudar por dois anos para cuidar do
filho, visto que, com essa nova responsabilidade desejam o melhor para os seus
bebês. A minha avó ajudou bastante depois que tive que
voltar para a escola, ela disse que parar de estudar eu não iria. Então, hoje
quero fazer uma faculdade e me formar. Não é por mim, mas pelo o meu filho. Eu
quero dizer que tudo isso é por ele – Jasmim (15 anos). A minha mãe sempre aconselhou a nunca parar de
estudar. Então, penso muito no futuro dos meus filhos, quero dar o melhor para
eles e nunca faltar nada – Amarílis (18 anos). Desta forma, a gravidez na situação das
entrevistadas não foi, independemente da classe social, empecilho para deixar
de estudar, porém elas tiveram estímulos e apoio familiar para manter-se
estudando. Em outras pesquisas, a maternidade na adolescência gerou a
interrupção dos estudos (DIAS et al.,
2011). Assim, as jovens entrevistadas continuam, mesmo depois da gravidez, planejando
melhorias para si e para os seus filhos, por vezes, “a maternidade pode ser um
motivo estimulador e fortalecedor para a continuação da vida escolar” (SOUZA,
2013, p 96). Por fim, outro ponto que elas consideraram
importante para ser mãe é saber educar e ter, principalmente, muita paciência e
atenção com os seus filhos. Características estas remontam a uma maternidade
responsável (GONDIJO; MEDEIROS, 2008).
Ser mãe precisa de muita paciência. Tem horas que
por mais que a gente ame o nosso filho queremos jogar tudo para alto, mas aí
lembramos que temos que ter paciência. Precisamos ser fortes e ter responsabilidade
– Margarida (17 anos). Ser mãe é cuidar e dar educação aos filhos.
Criamos eles para o mundo e tenho que ensinar o que é certo e errado – Amarílis
(18 anos). Para ser mãe tem que ter aquela atenção, um
acompanhamento e amor acima de qualquer coisa. Precisa está presente na vida,
nos estudos e no crescimento dele – Dália (18 anos). 3. Sentimentos
na gestação e maternidade: “cada momento você descobre novas coisas, novos
sentimentos” Neste, foi possível notar que os principais
sentimentos apontados pelas participantes durante a gestação foram: medo,
tristeza e ansiedade. Demonstrando, assim, as inseguranças vividas nessa fase e
típicas para qualquer gestante de “primeira viagem”: “(...) no início tinha muito medo de não ter
condições de criar ele, então sentia certa tristeza” no relato de Jasmim;
ou ainda: “Na minha gestação sentia
ansiedade em querer ver logo ele” nas palavras de Rosa. Mas, após o nascimento dos seus filhos e com
exercício da maternidade, citaram sentimentos de amor, carinho, afeto e
felicidade com a criança. Maternidade dá muito trabalho, mas tem aquela
parte do amorzinho quando ele começa a sorrir. É muito bom cuidar dele e ter
alguém para amar e ficar do lado babando – Rosa (16 anos). Ser mãe é um afeto muito grande. Tenho um afeto
muito grande pelo o meu filho, gosto muito dele e tenho medo de que aconteça
alguma coisa com ele – Jasmim (15 anos). Durante a gestação você descobre que ama alguém
mesmo não vendo. Cada dia é um novo sentimento. O que mais de destaca é o amor
porque é uma pessoa que você ama muito e quer cuidar mesmo não sabendo de nada.
A minha mãe e a minha sogra pediram várias vezes para cuidar dele, mas não abri
mão porque amo muito o meu filho e descobrimos isso perto dele – Orquídea (18
anos). Logo, observa-se que mesmo diante dos sentimentos
de medo, ansiedade e tristeza ao estar grávida na adolescência, após a criança
nascer, as jovens relatam o processo de construção dos vínculos afetivos com os
seus filhos. Desmitificando, portanto, a natureza instintiva do amor materno
(BADINTER, 1985). Afinal, é um amor conquistado e/ou espontâneo entre mãe e
filho. Contudo, ser mãe na adolescência também pode ser
uma experiência que pode gerar sentimentos “aprisionamento” em razão das
sensações de uma perda de liberdade, devido às novas responsabilidades
adquiridas com a chegada da criança (SOUZA, 2013). Logo, mudanças no cotidiano
acabam sendo necessárias como Angélica relata: Antes eu saia muito e hoje tenho que ficar mais
quieta. Antes todo horário vago que não tinha que estudar estava em alguma
festa. Tenho mais responsabilidade depois que o meu filho nasceu. Caso tenha
que sair vou para um lugar adequado onde o meu filho também possa ir e ficar
comigo, não posso sair sem ele. 4. Relevância
das figuras de apoio e/ou referência: “sem a minha mãe não sei o que seria
de mim” A partir da narrativa das participantes, elas
apontaram como essencial, durante a gestação e, após o nascimento dos seus
filhos, o apoio que tiveram, principalmente, de suas mães, bem como dos demais
familiares e amigos, desde o cônjuge, avós, tias, sogros(as) e colegas de
escola. Desse modo, é possível afirmar que a família é uma
das fontes fundamentais de apoio, proteção e cuidado, assim como um meio de
buscar fortalecer a mãe adolescente a superar os medos, os desafios da
maternidade e, consequentemente, melhorar a sua qualidade de vida e a do seu
bebê (BRAGA et al.,2014). Nesse
sentido, todas as participantes apresentaram suas mães como o membro familiar
de referência, apoio e transmissão dos ensinamentos e cuidados maternos com a
criança. Assim, conta Angélica: “Na
gestação tive o apoio da minha mãe e após o nascimento do meu filho da minha
mãe também. O apoio dela foi importante porque o amor que ela me deu estou
dando para o meu filho”. Diante disso, os ensinamentos, cuidados, atenção e
carinho que são passados de mãe para filha é de extrema importância para que
venha auxiliar a adolescente nos cuidados com o seu bebê. Dado que esse apoio
possibilitará que a jovem se sinta mais segura e capaz de cuidar do seu filho.
Logo, o apoio e a transmissão de conhecimentos da mãe da gestante dará melhores
condições de cuidados de si e do filho: (...) a mãe não transmite
apenas as mensagens de sua cultura a respeito da sexualidade, gestações, maternidade
e como ser mulher; também transmite as respostas às mensagens que recebeu de
sua própria mãe. Assim a transação entre mãe e filha é uma transação entre três
gerações (JOFFILY, 2010, p 36). Assim, além das mães das entrevistadas, tias e avós são outras
figuras femininas muito presente nos relatos delas quando perguntadas com quem
vem aprendendo acerca dos cuidados maternos. Configurando-se, possivelmente,
uma transmissão intergeracional, isto é, ensinamentos passados por gerações
cujos membros mantêm contato (CABRAL; LEVANDOWSKI, 2012). CONCLUSÃO Com base na aproximação da realidade das
adolescentes desta pesquisa, foi possível compreender que as jovens mães se
sentem diferente após a maternidade no que diz respeito ao modo de pensar e
agir. Para elas a maternidade é
percebida como um momento de maior responsabilidade, amadurecimento e
autonomia, pois esse novo fenômeno em suas vidas abriu espaço para que elas
amadurecessem e ser reconhecidas com base nas suas capacidades. Apesar dos
estigmas que podem surgir relacionados à gravidez na adolescência, os sentidos
da maternidade para as entrevistadas vêm sendo (re)significados juntamente com
a prática do cuidado com a criança, uma vez que as adolescentes buscam a cada
dia superar as barreiras de dificuldades e preconceitos sociais. Por vezes,
para as participantes da pesquisa, a gravidez pode ser uma possibilidade de reconhecimento/valorização
social e a formação de um núcleo familiar desejado. REFERÊNCIAS ARAÚJO, N.B;
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discussão comparativa e aplicação nas áreas de saúde e humanas. Petrópolis. Vozes; 2003.
[1]Psicóloga,
professora e pesquisadora do curso de Psicologia da Universidade Federal de
Roraima (UFRR); Orientadora pelo Programa Institucional de Bolsas de Iniciação
Científica da Universidade Federal de Roraima (PIBIC/UFRR); e Mestre em
Psicologia Clínica pela Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP). Endereço
Eletrônico: macedo.talitha@yahoo.com.br Recebido 22/04/2018. Aceito para publicação 22/04/2018.
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